quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

UMA FLOR DO CANTEIRO DE CARMEM


Carmem Vasconcelos
(Angicos 1965)
Poeta potiguar

Terceira cantiga de abril

Agora te conheço, amor perdido,
Macerando meu corpo animado e morto.
Agora te conheço, amor perdido,
Planando numa dessas folhas de vida.
Agora te conheço, amor perdido,
Súbito reverso dos meus ossos.
Agora te conheço, amor perdido,
Cinza de alumínio, câncer amarelecido,
No entanto, padeço de liberdade.

JUSTAPOSIÇÃO

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

CINCO DÚZIAS DE POEMAS – UM PRESENTE DE GREGO

Resenha

por Enzo Carlo Barrocco



60 Poemas: um pequeno apanhado de Kaváfis

A poesia grega vem à baila com o excelente trabalho 60 Poemas (Ateliê Editorial, 2007, 160 páginas), escritos pelo excepcional Konstantinos Kaváfis (Alexandria 1863 – Idem 1933) magistralmente traduzidos por Trajano Vieira (professor de Língua e Literatura Grega do IEL) dando a oportunidade para o leitor brasileiro entrar em contato com a poesia grega mais recente. A sutileza coloquial sempre acompanhou Kaváfis em sua poesia e isso Trajano busca levar para sua tradução. Segundo alguns críticos, existe algo de Borges em Kaváfis, uma vez que sua maneira ambígua de escrever dá a ele essa conotação. A poesia deste autor grego excita sempre a uma provocação, pois a marginalidade permanente no que diz respeito a memória é um dos seus principais argumentos. Kaváfis desdenha dos chamados falsos artistas da palavra, que ele caracteriza como verborrágicos e prolixos. Nesse ponto concordo plenamente com o autor grego. Lembro aqui uma frase de Mario Quintana, um dos nossos maiores poetas: “Exatamente por execrar a chatice, a longuidão, é que eu adoro a síntese”. Pois Bem! O espírito Alexandrino de Kaváfis é obscurecido, em certas traduções, pela maneira prosaica na qual é vertido. Portanto, se entregue à poesia inconteste de Konstantinos Kaváfis, poeta de Alexandria, um dos berços da civilização.


UM POEMA DE KAVÁFIS

ESPELHO DA ENTRADA


À entrada da mansão
havia um grande espelho muito antigo,
comprado pelo menos há mais de oitenta anos.

Um rapaz belíssimo, empregado de alfaiate
(e nos domingos atleta diletante)
estava ali com um pacote.

Deu-o a alguém da casa, que o levou para dentro
com o recibo. O empregado do alfaiate
ficou sozinho, à espera.

Acercou-se do espelho e mirou-se
para ajeitar a gravata. Após cinco minutos,
trouxeram-lhe o recibo e ele se foi.

Mas o antigo espelho, que vira e revira
nos seus longos anos de existência
coisas e rostos aos milhares;
mas o antigo espelho agora se alegrava
e exultava de haver mostrado sobre si
por um instante a beleza culminante.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

A POESIA LATINO-AMERICANA DE OCTÁVIO PAZ

IRMANDADE


Octávio Paz
Mixcoac 1914 – Cidade do México 1998
Poeta e ensaísta mexicano

Sou homem: duro pouco
e é enorme a noite.
Mas olho para cima:
as estrelas escrevem.
Sem entender compreendo:
Também sou escritura
e neste mesmo instante
alguém me soletra.



(Tradução: Haroldo de Campos)

JIRAU DIVERSO Nº 16

JIRAU DIVERSO
Nº 16 – junho.2007
por Enzo Carlo Barrocco

A poesia fluminense de Fagundes Varela
O POEMA
Soneto
Desponta a estrela d'alva, a noite morre.
Pulam no mato alígeros cantores,
E doce a brisa no arraial das flores
Lânguidas queixas murmurando corre.
Volúvel tribo a solidão percorre
Das borboletas de brilhantes cores;
Soluça o arroio; diz a rola amores
Nas verdes balsas donde o orvalho escorre.
Tudo é luz e esplendor; tudo se esfuma
Às carícias da aurora, ao céu risonho,
Ao flóreo bafo que o sertão perfuma!
Porém minh'alma triste e sem um sonho
Repete olhando o prado, o rio, a espuma:
- Oh! mundo encantador, tu és medonho!
O POETA
Luis Nicolau Fagundes Varela, poeta fluminense (Rio Claro, RJ 1841 – Niterói 1875) destaca-se por uma obra marcada pela brasilidade. O poeta antecede ao Condoreirismo, assim como à literatura abolicionista que mais tarde escritores renomados viriam abordar. Atuante e engajado, Varela, por outro lado, teve uma vida boêmia e desregrada que o levou ao alcoolismo. Um poeta essencial e sua belíssima obra.
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ESTANTE DE ACRÍLICO
Livros Sugestionáveis
São Bernardo (Romance)
Autor: Graciliano Ramos
Edição: Editora Record
Um homem rude, sem instrução e violento vivendo uma tragédia engendrada por ele mesmo nos sertões nordestinos. Um clássico da literatura brasileira.
Rebanhos de Pedras & Esta Terra (Poesias)
Autor: Ademir Braz
Edição: Usimar Cultural
Dois períodos distintos da poética de Ademir. “Esta Terra”, publicado em 1981, foi seu primeiro livro. “Rebanhos de Pedras” é um trabalho mais recente, ambos eivados de lirismo.
Publicação Coletiva – Quatro Autores (Poesias)
Autores: Jorge André, Kildervan Abreu, Eduardo Dias e Marcio Leno Maués
Edição: Secult - FCPTN
Poesia a quatro mentes patrocinada pela Secretaria de Cultura do Pará. Jovens poetas paraenses trazendo à luz a literatura nortista. Poesias de ótima qualidade.
A FRASE DI/VERSA
Preservar a saúde com regras tão severas e uma doença preocupante.
- La Rochefoucauld (Paris 1613 – Idem 1680) filósofo e ensaísta francês.

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DA LAVRA MINHA


quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

O DIÁRIO DOS PENSADORES - PÁGINA 18

A lei é poderosa; mais poderosa, porém, é a necessidade.
- Goethe (Frankfurt 1749 – Weimar 1832) poeta, dramaturgo, ensaísta e romancista alemão

A prova de que estou ficando velho é que, cada vez mais, eu chamo
os outros de você e os outros me chamam de senhor.
- Max Nunes (Rio de Janeiro 1922) compositor, produtor de TV, contista e humorista fluminense

Um hábito duradouro de não pensar em nada errado dá uma aparência superficial de ser correto.
- Thomas Paine (Thetfort 1773 – Nova York 1809) político, filósofo, matemático, físico, teólogo e ensaísta inglês

A alegria é o melhor remédio que o céu fornece aos homens, capaz de curar todas as chagas.
- Torres Pastorino (Rio de Janeiro 1910 – Brasília 1980) dramaturgo, radialista, filósofo e jornalista fluminense

A poesia é sempre um ato de paz. O poeta nasce da paz como pão nasce da farinha.
- Pablo Neruda (Parral 1904 – Santiago 1973) poeta chileno

A ironia, planta rara, não viça em mato bravo; o humor exige estufa.
- Afrânio Peixoto (Lençóis 1876 – Rio de Janeiro 1947) romancista, ensaísta, crítico, político e historiador literário baiano

A pintura nunca é prosa. É poesia que se escreve com versos de rima plástica.
- Pablo Picasso (Málaga 1881 – Mougins, França 1973) pintor e escultor espanhol

A meia idade começa quando se deixa de recriminar contra a geração dos pais para recriminar contra a geração dos filhos
- Laurence J. Peter (Vancouver 1919 – Palos Verdes, EUA 1990) cientista e ensaísta canadense

A incerteza que esvoaça, desgraça muito mais do que a própria desgraça.
- Menotti del Picchia (São Paulo 1892 – Idem 1988) poeta paulista

É egoísta achar que só você pode fazer uma pessoa feliz e para o resto da vida.
- Patrícia Pillar (Brasília 1964) atriz nascida no Distrito Federal

A linguagem política dissimula para fazer as mentiras soarem verdadeiras e para dar aparência consistente ao puro vento.
- George Orwell (Nova Delhi 1903 – Londres 1950) romancista e ensaísta inglês nascido na Índia

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

CARLITO AZEVEDO: O POETA DA ILHA

ROI


Carlito Azevedo
Rio de Janeiro 1961
Poeta e crítico literário fluminense

Rói qualquer possibilidade de sono
essa minimalíssima música
de cupins esboroando
tacos sob a cama

imagino a rede de canais
que a perquirição predatória
possa ter riscado
pelo madeirame apodrecido

se aguço o ouvido
capto súbito
o mundo dos vermes

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

MAIAKOVSKI E A MODERNA POESIA RUSSA


Vladimir Maiakovski
(Bagdádi 1893 - Moscou 1930)
Poeta russo

Não acabarão com o amor,
nem as rusgas,
nem a distância.
Está provado,
pensado
verificado.
Aqui levanto solene
minha estrofe de mil dedos
e faço o juramento:
Amo
firme
fiel
e verdadeiramente.

Tradução de E. Carrera Guerra

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

BRUNO CATTONI: UM JORNALISTA NAS SENDAS DA POESIA


Bruno Cattoni
(Rio de Janeiro 1957)
Poeta e jornalista fluminense

Poema Ontológico

Ser único sem relação
encerrado no espaço
onde o há o largou em lugar nenhum.

Ser excludente esvaziado
da capacidade do outro que se recolhe
à significação ausente.

Ser que não tem vanguarda ou verso
se esgana como toalha imaterial torcida
vincando no repuxo
o vivido fora do presente,
ainda futuro, antes do memorável,
o que podia ter sido
e o que poderá não ser.

Ser anterior à justiça
mas merecedor da indulgência
de um tempo massacrado e sucateado no
instante.

Ser esmagado contra a própria totalidade
sendo existido por sua sombra.

Ser sem que,
montando sua cilada de ser
sem se surgir coisa dada.
Farsa da alma.

Forja desiniciada.

Tributário do esquecimento
(Mas como lembrá-lo se é sem ter sido?).

Momento-espaço
onde coube um sujeito
de que outro experimentou em visita.
(Adjetivos
à toa, expirados).

Substantivo composto de tudo que cerca.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

JIRAU DIVERSO N° 15

JIRAU DIVERSO
Nº 15 – maio.2007
por Enzo Carlo Barrocco
A poesia libanesa de Khalil Gibran
O POEMA
A Ilusão do Saber
(O Jovem)
Na floresta não existe
ignorante ou sábio:
quando os ramos se agitam,
a ninguém reverenciam.
O saber humano
é ilusório
como a cerração dos campos
que se esvai quando o sol
se levanta no horizonte.
Dá-me a flauta e canta.
O canto é o melhor saber,
e o lamento da flauta
sobrevive
ao cintilar das estrelas.
O POETA
Gibran Khalil Gibran, poeta, pintor e desenhista libanês (Bsharri 1883 – Nova York, EUA 1931) é um dos mais conhecidos poetas do Líbano e a sua escrita mística evoca os sentidos e os sentimentos de quem o lê. Além do árabe, escreveu também em inglês. Gibran obteve, por outro lado, grande notoriedade como pintor. A prosa poética, no entanto, é o seu maior atributo.
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ESTANTE DE ACRÍLICO
Livros Sugestionáveis
"Do Amor e Outros Demônios" (Romance)
Autor: Gabriel Garcia Marquez
Edição: Editora Record
Na Colômbia do século XVIII, um padre exorcista espanhol se envolve com uma marquesa adolescente que, dizem, demoníaca, cujos cabelos, por promessa, não poderiam ser cortados até a noite de seu casamento.
"O Câncer no Pêssego"
Autor: José Antônio Assunção
Edição: Editora Idéia
A poesia de Assunção fala de lubricidade e linguagem, adaga e fruta. A palavra breve, ternas melodias. Belos exercícios poéticos.
"Céu Caótico"
Autora: Maria Lúcia Medeiros
Edição: Secult / Pará
A autora levou para os seus contos toda a poesia que tinha na alma. Textos maravilhosos ilustrados com fotografias de diversos profissionais.
A FRASE DI/VERSA
A verdadeira ternura não se confunde com coisa alguma. É silenciosa.
- Anna Akhmátova (Odessa 1889 – Moscou 1967) poeta ucraniana
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DA LAVRA MINHA


A LITERATURA NOBEL DE JOSÉ SARAMAGO


José Saramago
(Azinhaga 1922)
Poeta, contista, romancista, dramaturgo, cronista, ensaísta, jornalista e crítico literário português

Eu luminoso não sou.
Nem sei que haja

Um poço mais remoto, e habitado
De cegas criaturas, de histórias e assombros.
Se, no fundo poço, que é o mundo
Secreto e intratável das águas interiores,
Uma roda de céu ondulando se alarga,
Digamos que é o mar: como o rápido canto
Ou apenas o eco, desenha no vazio irrespirável
O movimento de asas. O musgo é um silêncio,
E as cobras-d'água dobram rugas no céu,
Enquanto, devagar, as aves se recolhem.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

O DIÁRIO DOS PENSADORES - PÁGINA 17

Os livros são os patrimônios de uma nação.
- Nélida Pinón (Rio de Janeiro 1935) romancista e contista fluminense

Não fazer nada é o trabalho mais cansativo do mundo, pois você não pode se demitir e descansar.
- Thomas Paine (Thetfort 1773 – Nova York 1809) político, filósofo, matemático, físico, teólogo e ensaísta inglês

Ninguém pode contestar que o artista nasce com os dons superiores que o tempo e o trabalho farão maiores.
- Roquette-Pinto (Rio de Janeiro 1884 – Idem 1954) antropólogo e educador fluminense

A consciência não é nada mais do que outras pessoas dentro de você.
- Luigi Pirandello (Agrigento 1867 – Roma 1936) dramaturgo italiano

A vida é como uma sala de espetáculos: entra-se, vê-se e sai-se.
- Pitágoras (Samos 582 – Metaponto 500 a C.) filósofo grego

Assim como existem misantropos que têm aversão à sociedade, existem os misológicos que tem ódio ao raciocínio.
- Platão (Atenas 429 – Idem 347 a. C.) filósofo grego

Um homem nunca deve sentir vergonha de admitir que errou, o que é apenas dizer, noutros termos, que hoje é mais inteligente do que era ontem.
- Alexander Pope (Londres 1688 – Idem 1744) poeta inglês

Não há patíbulos nem verdugos para os milionários.
- Honoré de Balzac (Tours 1799 – Paris 1850) romancista francês

Os quarenta anos são a idade na qual finalmente a gente se sente jovem. Mas é tarde demais.
- Pablo Picasso (Málaga 1881 – Mougins, França 1973) pintor e escultor espanhol

O amor. O que é seu, é meu. E tudo que é meu, é seu.
- Plautus (Úmbria 254 - Roma 184 a. C.) dramaturgo romano

O dia mais longo acabou cedo.
- Plínio, o Moço (Comum 61 – Bitínia 114) historiador romano

Palavras, com freqüência, são as cortinas do pensamento.
- Plutarco (Queronéia 46 – Idem 120) historiador grego

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

POEMA PARA CECÍLIA

Enzo Carlo Barrocco



A longa luz de Cecília, luz de um século,
a beleza de seu rosto grave;
sua cadeira feita de nuvens
em sua sala de azul e poemas.

As lindas mãos de Cecília
sobre a mesa de pinho
criando paisagens
e enternecendo os anjos.

Cecília canta o seu verso vário;
e este dia que se vai no tempo
eterniza-a
nos que aqui estão.
Ave, Cecília! Ave, seus olhos de infinito!

ALVARENGA PEIXOTO: O POETA INCONFIDENTE

Inácio José Alvarenga Peixoto, poeta fluminense (Rio de Janeiro 1744 – Ambaca, Angola 1793), estudou no Colégio dos Jesuítas no Rio de Janei...