O achado / Dennis D.
Bella Odetta não tinha tempo para si. Vivia a correr pela casa, sempre com uma vassoura nas mãos ou com um cesto de roupas apoiado na anca, sempre de avental amarrado na cintura, sempre de chinelos de borracha, sempre com um lenço na cabeça.
Um dia, Bella Odetta abriu a primeira gaveta de sua cômoda e começou a ajeitar a roupa íntima. Entre as calcinhas de algodão, achou uma certa peça (talvez feita de seda), uma espécie de camisola longa, muito delicada, de um tom levemente azul, e que parecia irradiar luz de luar. Os dedos nodosos iluminaram-se no azul. Bella Odetta chegou a pensar em radiação atômica e sentiu medo, mas não se tratava de nada atômico, nem aquilo era uma camisola; era, isto sim, a alma de Bella Odetta, perdida no verão de 1961 e ainda em perfeito estado de conservação, sem mofo, sem manchas, sem furinhos de traças e com perfume de água de violetas.
E agora? O que fazer com o achado? Bella Odetta ficou pensativa. Queria-mas-não-queria fechar a gaveta.
DO BLOG DO DENNIS D.
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